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INTRODUÇÃO
É comum que se estabeleçam comparações
entre obras literárias famosas, porém, não é sempre que essas comparações
aconteçam entre uma obra literária e um livro Bíblico.
Este trabalho tem como objetivo encontrar
semelhanças de linguagem e estrutura entre os livros Cântico dos Cânticos, de
Salomão e Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga.
Para que se possam esclarecer essas semelhanças será
realizada uma breve elucidação histórica, sobre os personagens principais de
ambas as obras, e destacados trechos dos livros, a fim de comprovar as
similaridades.
Esse estudo será embasado nas explicações de
teóricos literários, incluindo o prefácio da obra Marília de Dirceu, escrito
por Rodrigues Lapa.
Espera-se, que esse estudo possa contribuir para com
os interesses das pessoas que buscam conhecimentos literários.
2
SALOMÃO E SULAMITA
Salomão, filho do Rei Davi, reinou 40 anos em
Jerusalém, sobre Israel, e foi considerado um homem muito sábio e, devido suas
grandes conquistas, muito rico.
Segundo a Bíblia Sagrada, Deus lhe mandara pedir o
que quisesse e ele lhe pediu sabedoria.
Era admirador das artes, possuía instrumentos
musicais e escreveu os livros bíblicos: Salmos, Provérbios, Eclesiastes e
Cântico dos Cânticos.
Conforme o livro de I Reis (11.1-3), Salomão teve 700 esposas e 300
concubinas, a maioria advindas dos reinos por ele conquistados, mas foram à
Sulamita que ele dedicou suas canções.
Escrito em Jerusalém, no ano de 1020 a.C., o livro
Cântico dos Cânticos, que em algumas traduções Bíblicas recebe o nome de
Cantares de Salomão, relata que Sulamita trabalhava, a mando de seus irmãos,
como guarda de vinhas.
O rei foi à vinha da família da moça e quando a viu se apaixonou. Salomão
a leva com ele, e a abriga em suas tendas e inicia-se um cântico nupcial.
É um livro poético, em apenas oito capítulos, onde
Salomão e Sulamita - seus principais personagens - dialogam sobre seus
sentimentos, auxiliados pelo coro que tem a finalidade de enfatizar a história
louvando o amor do casal.
3
DIRCEU E MARÍLIA
Dirceu – pseudônimo do poeta Tomás Antônio Gonzaga -
foi o cantor de Marília – nome dado pelo poeta à Maria Dorotéia Joaquina de
Seixas - uma moça de 15 ou 16 anos por quem o poeta, homem já experiente, se
apaixonou.
Através dos estudos realizados atesta-se que Tomás
Antônio Gonzaga teve várias paixões, mas foi ao seu grande amor, Maria
Dorotéia, que ele compôs suas liras.
Portanto, a obra Marília de Dirceu apresenta um
idílio amoroso entre a moça inexperiente e o homem maduro.
Gonzaga morava em Vila Rica, mas as coisas não
estavam bem em seu trabalho como ouvidor. Entrando em conflito com o governador
Luís da Cunha Meneses – homem autoritário – tornou sua situação bastante
delicada.
Após ser nomeado ao posto de Desembargador da
Relação da Baía começou a pensar em casamento com Maria Dorotéia quando, por
consequências de traições políticas, Gonzaga recebeu ordem de prisão do, então
governador, Visconde de Barbacena.
Foi enviado para a masmorra da Ilha das Cobras, de
onde continuou a escrever suas liras a sua amada. Os meses que passou nessa
masmorra foram vividos na esperança de que tudo iria ser explicado e ele seria
libertado para viver ao lado de sua Marília para sempre. Mas, depois de vários
meses de prisão, foi condenado a 10 anos de degredo para a cidade de
Moçambique.
Partiu sem dizer adeus a Marília, mas deixou
registrado, para sempre, o amor que viu afastar-se dele por consequência de uma
prisão injusta.
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LINGUAGEM E ESTRUTURA DAS OBRAS
O arcadismo foi um movimento literário que aconteceu
entre os anos de 1.768 e 1836.
Conforme Tufano (1988, p.75), o arcadismo expressa
uma visão mais sensualista da existência, propondo uma volta à natureza e um
contato maior com a vida simples do campo, recriando as paisagens campestres de
outras épocas, com pastores e pastoras cantando e vivendo uma existência sadia
e amorosa, preocupados em cuidar de seus rebanhos.
Conforme Massaud (2001, p.225) a imitação dos
antigos, em pouco tempo transformada num dos postulados diletos dos árcades,
não queria dizer mera cópia servil, mas estímulo que um modelo de perfeição é
capaz de provocar na genialidade latente de um poeta ambicioso de atingir o
máximo de suas virtualidades.
Marília de Dirceu é uma obra na qual o desejo de
voltar a uma época - e essa época pode ser comparada a vivida no século XI
a.C., contexto histórico do livro Cântico dos Cânticos de Salomão, onde a
simplicidade da vida campestre é representada pelo pastoreio, vinhedos e jardins
- faz com que Tomás Antônio Gonzaga, apaixonado por Maria Dorotéia, se
apresente sobre o pseudônimo de Dirceu, pastor de ovelhas, e que também se
refira à sua amada como a pastora Marília.
Observe-se como Dirceu inicia seus cânticos.
“Eu, Marília,
não sou algum vaqueiro,
Que viva de
guardar alheio gado;
De tosco trato,
de expressões grosseiro,
Dos frios gelos
e dos sóis queimado.
Tenho próprio
casal e nele assisto;
Dá-me vinho,
legume, fruta, azeite,
Das brancas
ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas
lãs, de que me visto.”
(p.1)
Agora,
observe-se Sulamita e o seu amado dialogando em seu encontro:
Sulamita - Dize-me, ó
tu, a quem ama a minha alma: Onde apascentas o teu rebanho, onde o recolhes
pelo meio - dia; pois porque razão seria eu como a que erra ao pé dos rebanhos
de teus companheiros.
Salomão - Se tu o não sabes, ó mais formosa
entre as mulheres, sai-te pelas pisadas das ovelhas, e apascenta as tuas cabras
junto às moradas dos pastores.
(1.7-8)
Outro ponto em comum, nesses dois livros, e que faz
parte de suas estruturas são o aparecimento do coro - que em Marília de Dirceu
são enfatizados nos últimos versos de algumas estrofes e no Cântico dos
Cânticos se apresentam nas vozes das filhas de Jerusalém, que eram escravas da
realeza e serviam a noiva de Salomão.
Alguns exemplos em Marília de Dirceu:
Graças, Marília bela,
Graças à minha estrela!
(p. 1-4)
Marília, escuta
Um triste pastor.
(8-12)
São estes os sítios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marília, tu chamas?
Espera, que eu vou.
(p.12-15)
Em Cântico dos Cânticos:
Volta, volta, ó Sulamita,
Volta, volta, para que nós te
contemplemos.
(6.13)
Que é o teu amado melhor do que o meu, ó
tu, mais bela entre as mulheres? Qual é a diferença entre teu amado e outro amado,
para que assim nos supliques?
(5.9)
Para onde foi o teu amado, ó tu, a mais
bela entre as mulheres? Para onde virou a vista o teu amado, e o procuraremos
contigo?
(6.1)
É possível estabelecer, também, semelhanças na forma
de expressar o amor às amadas, entre a linguagem de Salomão e Dirceu.
Dirceu:
“Os teus olhos espalham luz divina,
A quem a luz do sol em vão se atreve;
Papoila ou rosa delicada e fina
Te cobre as faces, que são cor da neve.
Os teus cabelos são uns fios d’ouro;
Teu lindo corpo bálsamo evapora...”
(p.2)
Salomão:
“Tu és bela, minha amada, tu és bela!
Teus olhos são como os das pombas por detrás de teu véu; teu cabelo é como o
rebanho de cabras que descem pelas colinas de Gileade.
Teus dentes são como ovelhas tosquiadas,
que chegam ao lavadouro, todas são em pares, não falta nenhuma delas. Teus
lábios são como fio escarlate, e sua linguagem é agradável, como um pedaço de
romã é tua fronte...”
(4.1-3)
Tanto Salomão quanto Dirceu descrevem suas amadas
através de comparações que fazem da história um destilar de romantismo.
Enquanto Salomão compara sua amada com uma fonte de
jardim, Dirceu descreve a face mimosa de Marília como as misturas purpúreas de
folhas de rosa branca e de jasmim.
Dirceu cita nomes de deuses gregos (Vénus, Cupido,
Palas) e heróis (Aquiles, Hércules, Homero). Salomão recorre a cidades ou lugares
conhecidos (Vinhas de Em-Gedi, Saron, Tirza, Sião, Torre de David) e para
expressar as qualidades de sua amada se utiliza de comparações realizadas com
coisas que, naquele tempo, eram muito preciosas (mirra, madeira do Líbano,
lírios).
5
CONCLUSÃO
A partir do trabalho
apresentado pode se concluir que são notáveis as semelhanças, estruturais e de
linguagens, entre o livro Bíblico Cântico dos Cânticos de Salomão e a obra
Marília de Dirceu de Tomás Antônio Gonzaga.
Mesmo
sem possuir muitos estudos, essas semelhanças não deixam de ser percebidas por
quem faz a leitura dessas obras.
Ainda que o amor entre Salomão e Sulamita tenha sido
consumado e o de Dirceu e Marília não tenha encontrado esse êxito, é importante
ressaltar que, ambos os livros, são histórias de amor marcantes e que podem
servir de base para estudos mais aprofundados sobre linguagem e estrutura
literária.
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REFERÊNCIAS
- CANTARES DE SALOMÃO. A Bíblia de Promessas. Tradução de João ferreira de Almeida. 3. ed.Rio de Janeiro:JUERP/King’s Cross Publicações, 2006.
- CANTARES DE SALOMÃO. A Bíblia Vida Nova. Tradução de João Ferreira de Almeida. São Paulo: Vida Nova, 1995.
- CÂNTICOS DOS CÂNTICOS. Bíblia Sagrada. Tradução de Túlio Barros. Rio de Janeiro: Alfalit Brasil, 2002.
- GONZAGA, Tomás Antônio. Marília de Dirceu. 3. ed.Lisboa: Sá da Costa, 1968.
- MASSAUD, Moisés. História da literatura brasileira: Das origens ao Romantismo. 7. ed.São Paulo: Cultrix, 2001.
- TUFANO, Douglas. Estudos de literatura brasileira. 4. ed.São Paulo:Moderna, 1988.
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