segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Resenha : No início era o “Desmundo”.

Livro: Desmundo
http://www.livrariacultura.com.br/scripts/busca/busca.asp?palavra=desmundo&tipo_pesq=&tipo_pesq_new_value=false&tkn=0


                                                                     MIRANDA, Ana. Desmundo. 2. ed.São Paulo:Companhia das Letras, 1996. 


Em seu livro “Desmundo” lançado em 1996, pela Companhia das letras, Ana Miranda – autora de vários romances, entre eles “Boca do Inferno” em 1989, com suas obras traduzidas para vários países como Inglaterra, Estados Unidos, Alemanha, Itália, Espanha e Suécia e ganhadora do prêmio Jabuti em 1990 – apresenta a história de um grupo de órfãs enviadas ao Brasil, pela rainha de Portugal, para se casarem com os primeiros colonizadores.
A história é narrada por Oribela, uma das órfãs, que expõe o comportamento relacionado à moral e costumes de um mundo onde as mulheres eram criadas para “servir” ao homem em tudo e de tudo o que ele necessitasse.
A palavra “servir” é repetida, pela narradora, demonstrando as várias situações de escravidão não só para com a mulher índia, mas a negra, a freira e a esposa. A mulher devia servir seu esposo “como um padre na freira”.
A sequência da narrativa é dividida em partes que apresentam a chegada das órfãs ao Brasil, a descrição da terra, o casamento de Oribela e das outras órfãs, o fogo, como representação do inferno ao qual Oribela se sentia inserida, a tentativa de fuga, o desmundo que representa um mundo diferente aos avessos, a guerra, o mouro por quem a moça se apaixonou, o nascimento do seu filho e a parte final.
Alguns destaques importantes são retratados a partir de comportamentos e impressões da narradora, em relação ao índio, que reflete o pensamento dos portugueses e invasores.
Os índios eram vistos como uns animais selvagens. “... Um tanto de suas escravas, com grandes cestos na cabeça carregados e mesmo uns filhotes fêmeas ou machos pendurados em suas tetas...”
O indígena é diferenciado do ser humano e tratado como “natural”, como se não tivessem sentimentos. A “natural possui filhotes, as escravas têm crias.

“... A pobre Temericô enxergava tudo, parada na mata feito uma pedra, depois de algumas gritas se curvou sobre a barriga e gemeu feito cantasse, uma coisa estranha de se ver. Mandei assentar ao meu lado, o que ela fez. Não sabia que Brasil sente dor.”(p.144)


Esta obra de Ana Miranda oferece um resgate Histórico-Cultural a partir de uma rica pesquisa bibliográfica como A carta de Pero Vaz de Caminha, Duas Viagens ao Brasil de Hans Staden, Um tratado da cozinha portuguesa do século XV e Um curso de Tupi antigo feito pelo padre Lemos Barbosa, possibilitando, ao conteúdo lingüístico, do livro, uma aproximação da linguagem usada pelo português da época.
Em meio a seus sofrimentos, Oribela descreve com riqueza de tetalhes a paisagem de um mundo desconhecido.

“As árvores agrestes muito rijas, aos seus pés nasciam uns vimes que subiam até o mais alto delas como que mastros de navios e os seus ovéns. Lançavam odores de bálsamos, de castanhas e grandes ervaçais, seus troncos choravam suavíssimos licores, a mata era um pomar formoso de uns figos amarelos e frutas de espinho que cobriam o morro, matas e mangues...”( p.94)


Alain Fressnot consagrou em filme essa obra literária, levando ao cinema essa trajetória de descaso desmedido desvendado no “Desmundo”.
Portanto ler “Desmundo” é ter a possibilidade de resgatar a história do início da colonização do Brasil, com todo o seu contexto histórico-cultural, e ter o privilégio de saborear a leitura de uma boa obra da literatura brasileira.


Referência Bibliográfica
  MIRANDA, Ana. Desmundo. 2. ed.São Paulo:Companhia das Letras, 1996.

Referência Filmográfica
            FRESSNOT, Alain. Desmundo. Brasil: Sony Pictures. Drama, 2003, 101 minutos.

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